quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O Direito precisa de um Steve Jobs

Ontem faleceu Steve Jobs. E o que dizer dele? Jobs uma pessoa que revolucionou o jeito de lidarmos com a tecnologia. Ele não inventou novas medias, nem computadores, mas ele transformou coisas que antes era super complicado e somente acessível a poucos em algo popular compreensível pela população. Exemplificando: ele não inventou o computador, mas o popularizou na casa das pessoas com o computador pessoal; ele não inventou a música pelo celular, mas tornou isso extremamente dinâmico, agradável e simples através do iPod, do iPad, e do iPhone.

A morte de Steve Jobs me fez refletir sobre algo: quando estou trabalhando com o Direito me sinto as vezes um pouco como um engenheiro da computação mergulhado em milhares de códigos e acessos complexos que quase ninguém entende. O fato é que o sistema jurídico brasileiro é especialmente confuso e prolixo. Parece ser uma ciência hermética, acessível apenas aos engravatados que passam a vida sentados em torres de marfim, mas incompreensível para os que carregam o piano diariamente.

Talvez o caminho para desenvolvermos uma sociedade melhor e mais esclarecida seja transformar o Direito em algo mais palatável, mais compreensível ao leigo. Não digo que o estudo do Direito tenha que ser mais superficial, mas as pessoas que não estudaram Direito (pois não são obrigadas a fazê-lo) precisam ter acesso a um sistema mais claro, mais simples e menos rebuscado.

Não sei se dizendo isso me aproximo do "Direito Achado na Rua", de Roberto Lyra Filho. Por um lado acho que não, porque acredito que esse processo de aproximação do leigo não precise necessariamente partir dos movimentos sociais. Um Legislativo e um Judiciário que tenham esse sentimento já trariam muitos benefícios ao nosso país, e por que isso não pode partir de um processo democrático e pedagógico?

Por outro lado, o "Direito Achado na Rua" tem a ver com aproximar efetivamente as pessoas do processo político brasileiro. Afinal de contas um sistema jurídico-político mais simples e claro levantaria na sociedade muito mais questões relevante a uma transformação social positiva, possibilitando uma maior participação política, seja pelo processo político tradicional, seja pelos movimentos sociais.

Quem sabe essa hermeticidade do Direito seja fruto de uma forma perspicaz de manutenção do poder. Afinal, uma sociedade que entende mais de futebol do que de sistema eleitoral é muito mais fácil de governar. E essa situação não é de hoje, e nem é exclusividade do Brasil. Ao longo da história dá pra ver o que sistemas obscuros e alienantes de organização social já fizeram com as pessoas.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Traje Forense

É fato que este blog anda às moscas. Isso tem acontecido porque desde março passei a me dedicar com afinco obssessivo aos concursos públicos.
No último domingo fui prestar a prova preambular para delegado de polícia de São Paulo. Me mandaram lá para Guarulhos para fazer a prova, junto com pessoas de todo o Brasil, da letra R à Z. Em miúdos: desconsideraram totalmente a residência dos candidatos. Mas isso podia ser pior, teve gente que foi fazer a prova em Mogi das Cruzes...

Chegando ao local vi todo mundo de terno. Eu pensei: "ué, não precisava tanto, basta só estar com roupa típica de trabalho". O fato é que fui barrado na entrada por não estar de terno. Também foram barradas dezenas de pessoas que estavam com roupas "impróprias", segundo o delegado responsável.

Eu, na minha ingenuidade, interpretei "traje forense" como sendo a roupa que um delegado deve usar em suas atividades profissionais. Não sabia que era pra ir com roupa de casamento. Porém não fui o único, dezenas de pessoas foram barradas na entrada, principalmente mulheres, pois não estavam com o tal "traje forense".

Isso pelo menos me serviu de uma coisa: senti na pele o que é uma instituição ultrapassada e burocrática. Se numa prova de "marcar xizinho" eles barram quem não está de traje social completo, da pra sentir porque a polícia civil está defasada. E conversando com outros barrados, fiquei sabendo que isso é coisa da polícia civil de São Paulo, que esse tipo de postura não é regra nesses estados.

Isso também me serviu para pensar melhor que eu quero para minha vida profissional. Talvez um ambiente tão idiossincrático como esse não seja para mim.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Offline

Carrega rede, carrega rede.
Essa conexão que tanto cai
Coisas que são simples, mas
não carregam na minha rede.

Carrega rede, carrega rede.
Preciso ver aquele spam novo
Bater um papo com todo o povo
Mas não conecta a minha rede.

Carrega rede, aff, carrega rede...
Estou cansado de esperar
abrir o site daquele bar
E ler o cardápio que está na rede

Carrega rede, vamos aí, carrega re-de...
Vai logo, me deixar ver
Senão te troco pela tevê
E vou deitar na minha rede.

Voltou a rede, veja se pode
Agora chega de internet
Vou lá fazer algo que preste
Quem sabe ligo o meu iPod.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Depois do começo

Lázaro desceu as escadas, andou pela rua deserta, parou na esquina e olhou para os lados. Estava cansado de tudo isso. Entrou no seu carro velho com sua namorada que sempre o acompanhou. Pegaram juntos a auto-estrada. Numa curva ele sentiu um gelo na espinha. Tudo voltava, tudo era, tudo deixava de ser. Nas vitórias que teve sentia apenas ter cumprido seu dever. Mas nos fracassos, ah, nos fracassos ele se sentia vivo.

Mais vivo do que nunca com as mãos ao volante viu a curva da morte a sua frente. Tudo voltou a ser como antes. Tudo tinha se passado, nada tinha acontecido. Tudo que aprendera parecia não valer nada, porque a partir de então sabia que seria teria uma vida comum, ordinária. Não queria mais saber de pai, filha e de notícias escabrosas.

Essa é a estória de Lázaro, quem tiver alguma outra que me conte...

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Orgulho

Lázaro não esperava por isso. Acreditava que seus "poderes" eram inofensivos. Mas viu a armadilha em que caiu. Sentiu-se desorientado, pois não sabia o que fazer. Não sabia se parava com tudo, se largava esse mundo de sonhos ou se o desvendava de vez por todas. Como um crédulo, resolveu então ir ao único lugar em que poderia ter uma resposta: o Jardim do Velho.

Encontrou-o sentado num banco rústico e largo de madeira. O velho oráculo estava lendo calmamente um jornal enquanto fumava seu cachimbo. Como uma criança que se machucou num brinquedo, o jovem Lázarao se lamuriou ao Velho, contando tudo o que acontecera. Este respondeu arregalando os olhos cheios de rugas:
- Meu filho, você foi orgulhoso. A húbris tomou conta de você. A realidade não pode ser tão transformada sem que se exija algo em troca. O orgulho e o poder ilimitado cobram preços altos demais para um simples ser humano. E saiba, você é um simples ser humano, apesar de tudo.
- E eu estou condenado a viver sozinho sem poder contar as pessoas sobre toda essa tragédia que vêm dos meus sonhos?
- Mas é claro que não. Há muitos como você. Basta procurar.
- Onde? - perguntou Lázaro.
O velho então abriu o jornal que estava lendo e rasgou lentamente uma página, entregando-a ao jovem. Este começou a ler nela uma nota. Era uma história estranha de um desaparecimento de uma criança chamada Valentina. O principal suspeito era seu próprio pai.
- Devo ir atrás dela? - perguntou Lázaro.
- Veja o que o pai dela diz em seus sonhos. Quem sabe você poderá fazer um bem ao pai e à filha.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

O enigma do sino
















Ele continuava preso na armadilha de sonho. Cada vez que acordava as imagens, as sensações eram mais dissonantes e perturbadoras. Os rostos de seus amigos se difundiam, se confundiam e se misturavam. Sua falecida namorada saía do umbigo dele para ser posteriormente tragada involuntariamente por narinas. Era tudo estranho e perturbador. Nada fazia sentido.

Foi preciso um lapso de criatividade para que o enigma do paradoxo se resolvesse. Já entediado com tudo aquilo, o jovem começou a tentar moldar as imagens que via, juntando-as e separando-as com o movimento de seus braços. Começou a fazer objetos simples, como martelos, cadeiras, paredes, buracos e portas. Depois coisas mais elaboradas como, bicicletas, pássaros, árvores, relógios. Mas era tudo silencioso e efêmero. Surgiu então a ideia de fazer um sino. Juntou alguns pensamentos de metais que conhecia e forjou um enorme sino de ouro. Mas o objeto era tão grande e pesado que mal conseguia fazê-lo se mexer. Foi então que imaginou esse mesmo sino dependurado, alguns metros acima dele. Por fim imaginou uma corda atada ao pêndulo do pesado sino de ouro e, como uma criança, dependurou-se no sino, que produziu estrondosas baladas. Uma após a outra elas faziam tremer tudo que estava em volta. O nada tremeluzia e os pensamentos anteriores de Lázaro caiam ao chão, se estilhaçando em mil pedaços. No entanto, ele continuava dependurado. O sino batia cada vez mais forte, o som era cada vez mais terrível. O jovem sentia a corda vibrar cada vez mais intensamente. Foi então que a corda sumiu, o sino sumiu e Lázaro, também, sumiu.

Acordou com fortes badaladas de um sino distante, estava num sujo banco de praça numa manhã ensolarada. Ao fundo os sinos duma igreja tocavam alegremente. Muitas pessoas transitavam pela praça. Lázaro percebeu que, finalmente, havia se libertado do paradoxo. Havia resolvido o enigma.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Enfrentando o Paradoxo


As coisas do dia a dia aos poucos perdiam o sentido para o nosso heroi. Com treino e meditação, ele pode explorar mais e mais o mundo dos sonhos. Muito embora sua mente fosse bem clara e muito vazia de objetos e reminiscências, Lázaro percebeu que a mente dos outros eram pequenos, mas infinitos universos.

Viajar por seus sonhos era fácil e monótono. Lázaro já os conhecia bem. Não obstante, cruzando o subconsciente humano ele descobriu as portas e as janelas que conectam todas as mentes das almas vivas. Isso permitiu a Lázaro vislumbrar toda a infinitude de ideias e conceitos que habitam o subconsciente coletivo.

Com o tempo, ele se entediou com sua vida mundana. Passou a viajar cada vez mais pelo mundo dos sonhos. Deixou de dar importância para o tempo em que passava acordado as pessoas, todas lúcidas ao seu lado. Certo dia em um café, conversando com seu amigo Sérgio, passou a falar de suas viagens oníricas e de suas descobertas dos mais perturbadores pensamentos humanos. A princípio Sérgio encarou-o com bom humor, pois conhecia a personalidade de seu amigo. No entanto, os minutos foram passando e Sérgio começou a se sentir desconfortável com as frases sem sentido de Lázaro, que contava sem meias palavras como fazia para entrar nos sonhos das pessoas. Mas sabia ele que isso traria um efeito colateral.

Após um tempo de sua explanação perturbadora, como que num estalo, Lázaro sentiu uma mudança no ar. Olhou para a janela do café e viu nuvens cinzas se aglomerarem rapidamente. Raios reluziam conforme as nuvens mudavam de forma.

- Lázaro! Lázaro! - ouviu ele um chamado. Era Sérgio. Mas sua voz não saia de sua boca, que estava imóvel, mas vinha de longe, ecoando como se saísse do fundo de uma caverna.

- Lázaro! Lázaro! - novamente o chamado replicava. Lázaro sentiu uma vertigem, estava atordoado. A mesa, a xícara, a janela, tudo parecia derreter e borrar aos olhos dele. Sérgio já não era mais Sérgio. Ele era um ser sem forma, com olhos que mudavam de tamanho aleatoriamente. Sua boca e seu nariz dançavam pelo rosto que afinava e engrossava, acompanhando pulsações dissonantes. A janela se abriu, o vento entrou pelo café, e era ele tão forte que carregou papéis, xícaras, cadeiras, mesas, Sérgio, tudo.

- Lázaro! Lá...zaro! Lá...za...ro! - ele acordou.